quinta-feira, 25 de agosto de 2011

Capítulo 46

Daniela acordou exactamente como adormecera, sobre o corpo imóvel de Susana, cujo único indicio de estar viva era a respiração acentuada. “A gaja agora ressona?”, questionou-se a rapariga, franzindo o sobrolho. Consultou as horas e viu que ainda tinha algum tempo até às aulas. Sorrindo, levantou-se e tomou um duche rápido, afinal de nada valia esperar pela loura, quando dormia ninguém a acordava. Enrolada numa toalha, procurou as suas roupas, apenas para as encontrar amarfanhadas por ter dormido vestida. Resmungando, vestiu uma das sweaters da outra, decerto que esta não se iria importar.
“Hm…mor, porque é que não me acordaste?”, disse Susana, agora acordada, ainda deitada no sofá, a esfregar os olhos.
“Estavas tão cansada que achei melhor deixar-te dormir”, respondeu Daniela, que trazia o pequeno-almoço para ambas num tabuleiro.
“Desculpa lá por ter adormecido assim ontem…”, disse a loura, olhando para a rapariga com o seu habitual ar de cachorrinho. Sabia bem o que a morena teria gostado que tivesse acontecido na noite passada, apenas tinha sido um dia tão cansativo que não aguentara.
“Eu compreendo mas não te livras para a próxima”, replicou Daniela, dando as últimas dentadas no pão. O tempo era escasso e previa uma fila de trânsito imensa, pelo que não se podia demorar muito. Despediu-se da outra com um beijo, “Olha não faz mal que leve a sweater?”
“Não, eu gosto quando usas a minha roupa”, respondeu Susana, sorrindo. Não houve tempo para muito mais, a morena teve que se fazer à vida. Um quarto de hora depois estava no inevitável engarrafamento, apenas com um CD a tocar para ver se o tempo passava.
Mais meia hora e encontrava-se finalmente na faculdade. Por algum motivo, sentia-se mais observada que o habitual, nem sabia porquê. Podia jurar que sentia o olhar dos outros fixos nas suas costas, mas não conseguia entender porquê. Voltou-se para um grupo que cochichava, mas a única reacção que obteve foi um voltar de costas. Encolhendo os ombros, prosseguiu com a sua rotina. Pousou os livros no seu lugar habitual, apenas para ser encarada pela colega que habitualmente se sentava ao seu lado, de um modo nervoso.
“Bom dia”, saudou a rapariga, a quem o comportamento dos colegas estava impossível de ignorar, “Estás bem?”
“Sim…sim”, respondeu a outra, olhando para a morena, que ostentava uma expressão confusa, “Olha Daniela…”
“Diz”, instigou Daniela, devolvendo os olhares fulminantes que uns colegas lhe mandavam.
“Calculo que não tenhas visto…”, começou ela, enquanto retirava uma revista de dentro da mala, “Olha…”
Colocou em cima da mesa um exemplar de uma revista de mexericos popular e aguardou uma reacção por parte da rapariga. A morena arregalou os olhos ao ver na capa uma foto sua e de Susana tirada no dia anterior, em que a loura encontrava-se a pegar nela e esta beijava-a. Em letras vermelhas, abaixo, estava “ROMANCE LÉSBICO DE SUSANA MARQUES”. Quedou-se a olhar para a capa durante tempo incerto. Apenas interrompeu o seu estado petrificado quando o professor entrou, obrigando-a a divergir a sua atenção.
Incapaz de conter a sua curiosidade, pediu a revista à colega. Assim que teve oportunidade, colocou-a entre os livros, de modo a puder lê-la sem que o professor desse por isso. Tinha duas páginas reservadas só para especulações sobre a relação que tinham. Em termos gerais, de acordo com o artigo, ela, a “rapariga mistério”, não era senão uma parasita oportunista, desesperada por atenção e dinheiro e Susana Marques, a mais recente vedeta do mundo da música, sedenta de atenção e a tentar seguir a moda.
Pondo a revista de lado, tentou distrair-se com a aula, depois falaria com a loura. Estava a anotar umas informações importantes quando lhe passaram um bilhete para as mãos. Abriu e leu, “Então a Marques já te foi ao pito?”. Sentindo a paciência a esvair-se a olhos vistos, respirou fundo. Estava a fazer um bom trabalho até que a aula acabou e teve de enfrentar os comentários dos colegas. Desde todas as nomenclaturas para “indivíduo homossexual do sexo feminino” até a umas que lhe deram mesmo vontade de rir, por serem o tipo de coisa que ela diria.
O final das aulas pôs fim ao seu sofrimento Dirigiu-se para casa, onde esperava encontrar paz e sossego por fim. Infelizmente para si, o destino tinha outros planos. Nem em casa a maldita revista lhe dava tréguas. Sentada à mesa estava a mãe, com um exemplar idêntico diante de si e uma expressão de poucos amigos.
------------------------- -------------------------------------oOo-------------------------------------------------------
Por seu lado, Susana acabara de chegar à agência. Havia mais movimento à entrada do que o habitual, mas com as constantes estrelas que passavam por aquele edifício, não era de estranhar. Estacionou a mota e preparou-se para um dia de trabalho que se adivinhava produtivo, consequência da noite anterior. Estava ainda a reviver os acontecimentos, quando a multidão de fotógrafos e entrevistadores a avistou e avançou para ela. A sua reacção foi mínima, não entendia o que se passava pois não tinha feito nada merecedor daquela atenção.
Valeu-lhe a chegada do seu produtor, que enxotou os jornalistas e a levou para dentro. Não perdeu tempo a levá-la até ao seu gabinete e a passar-lhe o exemplar de uma revista para as mãos. Não pôde deixar de esboçar um sorriso ao ver-se a si própria mais a namorada na capa. Por acaso aquela era mesmo uma boa foto, Daniela não se poderia queixar que aquela lhe fazia um nariz enorme.
“O que é isto?”, inquiriu o outro, espetando o dedo na imagem da capa, com uma expressão muito pouco amistosa.
“Eu e a minha namorada”, respondeu a loura, como se de algo extremamente obvio se tratasse.
“Se não te achasse um diamante em bruto e não soubesse que ia ganhar imenso dinheiro contigo…”, grunhiu o patrão, interrompendo-se para massajar as têmporas, de modo a recuperar a calma, “Estavas despedida em dois tempos”
"Oi?”, perguntou a outra, sem fazer a mínima ideia do motivo pela qual estava a ser tão repreendida. A seu ver não tinha feito nada de mal.
"Já te passou por essa cabeça loura que te estás a arriscar a deitar tudo a perder?", continuou o homem, fazendo todos os possíveis para incutir algum juízo na cabeça da outra. Aquilo podia ser um golpe na sua mais recente fonte de dinheiro, até porque pelo que conhecia da loura, esta opor-se-ia a lucrar com aquela publicidade. "Tens noção que podes perder tudo o que já conseguiste?"
“O que é que isso importa quando tenho o amor da mulher que amo? Eu não tinha nada quando entrei nisto, se sair disto sem nada na mesma não faz mal”, disse Susana, pondo um ponto final naquela discussão. Agarrou no capacete e dirigiu-se para a saída, mas não sem antes dizer “Obrigada na mesma”
Vendo o seu grande trunfo pronto a virar as costas e o seu dinheiro a escapar-lhe por entre os dedos, o homem acedeu, finalmente, “Pronto…pelo menos tenta ser discreta em público”
“Isso posso fazer”, concordou a loura, “Mas não conte com que vá esconder isto, nunca o fiz e não o vou passar a fazer”

1 comentário:

  1. Aiiiiii. Finalmente consegui vir à net! Isto anda difícil porque fiquei sem pc ...
    Mas já li e já me deliciei! :)
    Estou a gostar da atitude de orgulho da Susana no seu namoro!
    Vou tentar vir mais frequentemente.
    Uma viajante dos blogues :) *

    ResponderEliminar