domingo, 29 de julho de 2012

Capítulo 99


“Hm…ai”, queixou-se Daniela, rolando sobre si mesma, no sofá de Marta. A dor no peito que sentia impossibilitou-a de continuar a dormir, embora estivesse esgotada. Não era uma dor interior, era superficial e aguda, tão forte que tirara a camisa para ver se havia algo de errado, apenas para se deparar com um piercing, uma argola ainda por cima, num mamilo, “FODA-SE!”

“Fala baixo, não estás em casa!”, respondeu Marta, no andar de cima. A ressaca era notória. Porém, por muito cansada que estivesse, por muito enjoada que se sentisse, era hora de se preparar para o grande evento.

Enquanto a rapariga continuava em parafuso pela sua mais recente aquisição, Marta aprontou-se. Saindo de outra divisão, Tiago, de smoking, penteado e a cheirar a aftershave, apareceu. No entanto, nem o melhor duche nem baldes de litro de café o fariam despertar, os efeitos da noite anterior estavam bem visíveis sob a forma de olheiras enormes e uma indisposição que não se desejaria a ninguém. Por sua vez, Marta, em melhor estado que, tanto Tiago, como Daniela, apareceu, sorridente e ansiosa. Mas, ao ver a morena, ainda com a roupa da noite anterior, fulminou-a com o olhar, “Ainda estás assim?!”

“Tu deixaste que aquela gaja de ar sinistro me fizesse isto?”, interrogou a rapariga, furiosa, levantando a camisola. Sensível ao álcool como era, ter discernimento suficiente para recusar uma proposta de um piercing duvidoso feito por alguém igualmente duvidoso, sob aquelas condições, era impossível.

“Nós ficámos com as Strippers mas tu tinhas que ser mais hardcore…”, justificou Marta, sem conter o gozo, “Foi a risada e, se pensares positivo, tens uma história para contar aos netos”

Daniela, ao invés de dar uma resposta coerente, limitou-se a deitar a língua de fora a Marta. Mas ela ia ver, oh se ia. De momento só esperava que Susana gostasse daquele lindo exemplo de arte corporal. Mas, por enquanto, teria que ajudar nos preparativos. Ora ajeitando a gola da camisa de Tiago, assegurando-o de que estava no seu melhor e prestes a fazer boa figura, ora garantindo a Marta de que iria correr tudo bem e que o fato lhe assentava bem, a rapariga não se pôde queixar de que não tinha que fazer. Arranjando-se como pôde, apesar de não ser o seu grande dia, fez por ficar bem, mais que não fosse para si própria e para Susana.

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Susana, acordada, abruptamente, diga-se de passagem, do seu sono pela mão de Guida a aterrar, de modo nada delicado, na sua cara, começou o dia por barafustar, “Foda-se, cuidado pega!”

“Ahm…”, murmurou Guida, rolando sobre si mesma, para continuar o seu sono de beleza. E tê-lo-ia feito, caso o bigode postiço do dia anterior não tivesse acabado na sua boca, fazendo-a engasgar-se até o cuspir, “Pff…que horror”

Mais desperta, a loura consultou o telemóvel, mais descansada por ver que Daniela a avisara de que estava tudo bem, e viu, muito para sua inquietação, de que dispunham de apenas duas horas para se aprontarem. Normalmente, para ela seria apenas necessária meia hora, mas, sendo a amiga a eterna perfeccionista, aquele tempo era insuficiente. Abanando o ombro de Guida, apressou-a, “Tens duas horas para estares toda boa e pronta a sair daqui!”

Olhando para o relógio e para a lista mental de todas as coisas que tinha que fazer, Guida, num momento em que perdeu toda a sua elegância e compostura, voou da cama, conseguindo tropeçar nos lençóis e aterrar no chão do quarto, arrancando os cobertores e arrastando a outra para o chão. Após ajudar a amiga a pôr-se de pé, Susana começou a despir-se, antes de ir para o duche. Entretanto, Guida, ao observar a loura, reparou que esta não tinha um único pêlo nas…zonas baixas. Ao olhar para o que restava do bigode postiço, bigode esse que estivera na sua cara todo o dia, notou que este era louro e demasiado realista.
“SUSANA!”

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Já no local combinado, uma quinta junto às imediações, com tudo, desde lago às melhores condições para uma festa do género, com Marta cruzando e descruzando os braços, Rodrigo em situação semelhante e Daniela tentando abstrair-se da dor, aguardaram por Guida e Rodrigo que, por algum motivo, estavam atrasados. Embora não fosse motivo para preocupações, não era característico de nenhum deles esquecer um princípio tão básico como a pontualidade.

“Achas que lhes aconteceu alguma coisa?”, perguntou Marta à rapariga, já prestes a roer as unhas, hábito que tentara largar mais que não fosse por ficar inestético.

“Pouco provável, a Susana já me disse que chegaram todos bem”, assegurou a morena, a eterna voz da serenidade e razão, ou pelo menos, era nisso que gostava de acreditar.

O som de o que aparentava ser um tractor enferrujado distraiu os presentes. Franzindo o sobrolho, todos se voltaram para a direcção de onde vinha o ruído. Aproximando-se, quando muito a quarenta quilómetros por hora, vinham os restos moribundos do Mercedes de Guida. Gemendo como um animal ferido, o carro, num derradeiro esforço, parou diante de todos os espectadores. Empurrando a porta que acabou por cair, Guida saiu, de cabeça erguida, seguida por Rodrigo, ao colo de Susana. Rodrigo não sabia se havia de chorar pelo seu jipe que iria para a sucata, se pela sua masculinidade magoada. Não deixando que pormaiores desses lhe estragassem o dia, sorriu.

Ao ver a loura, Daniela correu para junto desta, abraçando-a. Com os noivos presentes, puderam dar início à cerimónia. Primeiro as senhoras, como Marta fez questão de lembrar a Tiago. Picando Rodrigo, a outra, servindo-se da dica de Marta, encorajou o amigo a ir primeiro, afinal este era mais feminino que a maioria da população feminina. Rodrigo limitou-se a virar a cara, indignado. Suspirando por ter que assistir a tais picardias, Guida limitou-se a seguir com o protocolo, pegando na mão de Marta. Depois de ditos os sins, muito para gozo de Daniela, que fingiu fungar para um lenço, o que resultou num olhar de morte de Marta, o par trocou um beijo, selando o acordo.

Ajeitando a gravata, Rodrigo deu a mão a Tiago, repetindo o que tinha sido feito anteriormente, Se Tiago limpava o suor que lhe escorria pela testa de tão ansioso que se sentia, Rodrigo emitia risinhos agudos que poderiam ter vindo de uma rapariga de doze anos. No final, após os sins terem sido proferidos, Rodrigo pegou em Tiago pela cintura, não se fazendo rogado a trocar saliva, de modo explícito, por dois minutos inteiros. Junto a Daniela, Susana perguntou-se se deveria ficar enojada ou enternecida, se calhar ambas as hipóteses. Quando se separaram, ainda com saliva entre os dois, Rodrigo voltou a ajeitar a gravata, recuperando a compostura, com um sorriso enorme.

Depois de estarem concluídas todas as formalidades, a rapariga, saindo do pé da loura por um pouco, com um sorriso travesso, encontrou forma de se dirigir a Marta, ainda na presença de Guida. Mantendo a sua melhor poker face, perguntou, como quem não quer a coisa, “Então já mostraste à Guida a tua mais recente amostra de arte corporal?”

“Do que é que estás a falar?”, perguntou Marta, de olhos arregalados. Sabia que tinha bebido um pouco mas nada a ponto de fazer com que não se lembrasse da noite anterior.

“Mostra aí as costas”, disse a morena, com a poker face a desfazer-se a cada segundo. A amiga assim fez, exibindo, no fundo das costas, num padrão tribal, nada mais que o nome da ex namorada, tatuado para todo o mundo ver.

“O QUÊ?!”, gritou Guida, encolerizada, tanto que Tiago se escondeu atrás de Rodrigo, que por sua vez se escondeu atrás de Susana, que perdera toda a tonalidade da cara. Ia ser bonito…

“Juro que não sei como é que isto apareceu!”, balbuciou Marta, atónita. Se não estivesse a ver o nome da ex a reluzir à luz do dia, não acreditaria.

Daniela, mesmo podendo deixar a amiga a sofrer mais um pouco, resolveu salvá-la, antes que rebentasse uma veia a Guida, “Fiz isso a caneta de acetato, não te irrites”

“Puta que te pariu!”, guincharam Marta e Guida em simultâneo, muito para dor dos ouvidos da rapariga, que não teria sido poupada caso a loura não interviesse, para a levar dali.

Muito para alívio de todos, o resto do dia decorreu nos conformes, tanto que se tivessem que voltar atrás e mudar alguma coisa, não o fariam. Depois de acalmados os ânimos, Guida e Marta já se riam com a partida da morena. No final do dia, preenchido por todas as formalidades e tradições do mais convencional dos casamentos, no momento das danças mais lentas, Daniela, que vira todos os vídeos educativos sobre o assunto quanto conseguira, propôs à outra, “Apetece-te?”

“Daniela Sousa, não acredito que me estás a convidar para dançar”, replicou Susana, arqueando as sobrancelhas em jeito de gozo, “Aceito sim”

Puxando a loura pela mão, a rapariga pôs os braços por detrás do pescoço da outra, revirando os olhos quando esta pousou as mãos sobre as suas nádegas. Ainda assim, quando a música ia a começar, Susana assumiu a posição correcta. Não trocando os passos, a morena conseguiu acompanhar a outra, desta vez sem a pisar ou fazer cair, embora não fosse graciosa. O esforço valeu-lhe que a loura aproximasse os lábios do seu ouvido e murmurasse, “Muito bem”

“Queres sair por um bocadinho?”, convidou Daniela, já a ficar cansada, não apenas da dança, como, também, de estar rodeada por grandes magotes de gente.

A outra, dando a mão à rapariga, esquivou-se das pessoas, até saírem do edifício, para o jardim. Estava uma noite linda, amena e com o leve som de grilos como banda sonora. Sentando-se na relva, entre as pernas de Susana, a morena deixou-se apenas embalar, ouvindo os grilos e a respiração da loura. Já esta colocou os braços em torno do pescoço de Daniela, em silêncio. Manifestando-se, a rapariga perguntou, séria, “Gostas de piercings nos mamilos?”

“Ahm?”, admirou-se a outra. E pensar que a morena quebrara aquele momento para fazer a pergunta mais aleatória que lhe poderia ocorrer.

Sem responder, Daniela aninhou-se melhor nos braços de Susana. Se um dia lhe tivessem dito que a pessoa que conhecera um dia num bar de aspecto suspeito seria a mesma com quem, depois de muito tempo e muitos acontecimentos, estaria ali, a partilhar aquele momento, não acreditaria. E a melhor parte? Era que estava perfeitamente feliz.

quarta-feira, 18 de julho de 2012

Capítulo 98


 Finalmente :D

Já que Guida criara, sem sequer se esforçar demasiado, tal como acontecia com qualquer coisa a que se dedicava, a reputação de organizar festas objectivamente de arromba, embora de moral duvidosa, iria fazer jus a essa mesma reputação. Strippers e álcool, por muito apropriados que fossem, não eram o suficiente para tornar aquele dia inesquecível. Mas como é que havia de superar aqueles eventos cujas distracções fariam uma ninfomaníaca corar? Felizmente para ela, Rodrigo também desejava deixar aquele dia na memória de todos os presentes e, entre um e outro, chegaram a um consenso. Cada um contribuiria para o evento, afinal não haveria mais ninguém no planeta a quem confiassem tal tarefa. Ao ouvir o que seria o plano, Susana, que não se pronunciara enquanto lhe expunham a ideia, sentiu um arrepio, “Não posso alinhar nisso!”

“Vais e não tens voto na matéria!”, replicaram tanto Guida como Rodrigo, sorrindo de modo travesso. Estava fora de questão que a loura não comparecesse, tal ideia soava a blasfémia aos ouvidos de ambos.

“Mas…isso parece tão mal…”, gaguejou a outra, torcendo o nariz, “Pronto, é a vossa última noite antes de darem o nó mas não acham que é abusar um bocado?”

“Tu antes alinhavas na boa”, contrapôs Rodrigo, abanando a cabeça de modo acusador, e Guida, em tom em todo idêntico, acrescentou, “A Daniela domou-te bem, andas uma coninhas agora…”

“Não ando nada!”, contrapôs Susana, notoriamente tocada. Não era que pudesse fazer o que fazia antes, estava casada afinal de contas. Porém, alfinetadas na sua integridade levavam-na ao rubro. Rangendo os dentes, acabou por ceder, “Ok, mas nem uma palavra à Dani”

“Certíssimo”, concordaram Guida e Rodrigo, dando mais cinco um ao outro, muito para exasperação da loura.

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Foi assim que, uma semana mais tarde, Susana saiu de casa mas não sem se despedir de Daniela e de lhe assegurar que, mesmo que ela não lhe tivesse pedido, iria dando notícias. Não era que tencionasse fazer algo que pudesse vir a fragilizar as coisas, mas a rapariga estava perfeitamente consciente do que poderia esperar tratando-se de uma festa de Guida e a loura preferia jogar pelo seguro. Mais por considerar justo que por algum motivo adicional, a morena resolveu fazer o mesmo, no entanto não previa que a festa de Marta fosse algo muito fora do esperado, no máximo esperava erva, não contava com genitais à vista nem nada que se parecesse.

No último momento, a outra voltou atrás para beijar Daniela outra vez, só então, piscando-lhe o olho, é que deixou a sua companhia. O sorriso que a rapariga sempre pensou que conseguia disfarçar para não dar o braço a torcer e mostrar que também se derretia, com facilidade até, era das melhores partes do dia para si. Fez o percurso desde a sua casa até à de Guida, carregando no botão da campainha entusiasticamente. Depois de definir um plano para se divertir sem parecer atada e, ao mesmo tempo, sem pisar o risco, a sua expectativa para aquele evento melhorou muito. Guida, ainda com ar ensonado, embora penteada, afinal Deus lhe livrasse abrir a porta com um ninho de cegonhas na cabeça, saudou, “A porra da campainha não é para estragar, puta”

Revirando os olhos como resposta, Susana entrou, distribuindo festinhas pelos golden retriviers de Guida, “Bom dia coisa boa!”

“Já tiraste o dedo do cu e agora já estás entusiasmada, não é?”, replicou Guida, a quem a energia da loura causou algum espanto, sobretudo porque estivera prestes a ver que só contaria com a sua presença se a arrastasse.

“Nem te passa por essa cabeça linda”, disse a outra, encaminhando a amiga para a casa de banho, “Enquanto tomas banho, eu escolho a tua indumentária para o dia!”

Guida, por muito que quisesse contrapor, admitia que, se Susana deixara as suas habituais calças largas, e era quando não eram as de pano, em casa e trouxera umas de ganga, de boa marca, justas, ao menos podia deixá-la ter esse prazer, “Ainda me vou arrepender, pode ser mas se me fizeres parecer uma mendiga da esquina…”

“Calma, vais ver que vai correr bem”, garantiu a loura, sorrindo de orelha a orelha. Ignorando o olhar assustado da amiga, fechou-lhe a porta na cara e dirigiu-se ao imenso guarda-roupa desta, que consistia, de modo sucinto, numa divisão inteira. Deitando mãos à obra, pensou em como gostaria de ver Guida vestida. Muita pele à vista era imperativo. Realçar os atributos, mais que não fosse para ter para onde olhar, idem aspas. Satisfeita com a sua escolha, aguardou pela amiga.

Enrolada numa toalha, Guida, de sobrolho erguido, analisou a roupa que estava numa cadeira. Tinha que dar o braço a torcer, não lhe passaria pela cabeça que a outra soubesse combinar duas peças de roupa, quanto mais uma indumentária completa. Quer dizer, não poderia passar por uma esquina sem que lhe metessem notas na roupa interior, mas pelo menos não parecia uma prostituta de beira de estrada. Uma vez vestida, aprovou o resultado, ao ver-se ao espelho, “Estás a adorar, não é porca?”

“Ahm?”, balbuciou Susana, tirando a vista das pernas da amiga pela primeira vez desde que aparecera ali de toalha. Apanhada, olhou para cima, para a encarar, “Gosto, gosto”

Apesar de ter olhos, olhos esses de que se orgulhava muito, na cara, a melhor maneira de Guida saber se estava apresentável era através da reacção da loura. Ainda por cima, naquela ocasião, estava particularmente babada. A auto-estima de Guida, que se elevava como um balão, teve que voltar à Terra, figurativamente, uma vez que esta pairava sempre bem lá em cima, no momento em que Rodrigo tocou à campainha, afinal não podia passar o dia a apreciar-se ao espelho. Abrindo a porta, a outra deparou-se com o amigo, trajado tão a rigor como a amiga, o que fez com que tivesse que comentar, “O Tiago arrancou-te os pêlos do peito com os dentes?”

“Não, a tua mãe”, replicou Rodrigo, indignado. Não tinha sofrido durante meia hora para ter que levar com aquelas bocas, ainda por cima de alguém que não sabia apreciar a visão que era o seu peito, trabalhado com peregrinações ao ginásio e dieta cuidadosa ao mais alto nível, “Gajas…”

“Ignora, estás óptimo”, assegurou Guida. O mais provável seria que Rodrigo fosse tal e qual a sua pessoa, versão masculina e, como tal, entendia-o e defendia-o. Assim que todos estavam prontos, foram para o carro de Rodrigo, uma vez que o de Guida tinha dois lugares, um para Guida e outro para o peito desta, de acordo com Susana, que não se absteve de se pronunciar.

Depois de ser mimoseada por um bombardeamento de insultos, a loura sorriu e tirou do bolso, um bigode farfalhudo que passou à amiga. Guida, baralhada com a aleatoriedade daquilo, colocou-o na mesma. Rindo para dentro, a outra tirou uma foto a ambas, muito para espanto da amiga que revirou os olhos, na sua opinião, Susana estava demasiado frita para tentar perceber. Por sua vez, a loura mandou a fotografia a Daniela, dizendo:

“Consegui mesmo que ela usasse, se ela soubesse…”

O jantar decorreu normalmente, com tanta comida que alimentaria uma aldeia inteira, muito para satisfação da loura, que entretanto recebera o reportório da rapariga de como estava a decorrer o dia com Marta. Já tinha fumado e tanto ela como Tiago mal abriam os olhos na foto que lhe enviara mas nada levava a crer que fosse como o que Guida e Rodrigo tinham preparado. Voltando a sua atenção para a comida, a outra regozijou-se no facto da morena ser de confiança. Tinham discutido limites e Daniela, consciente de que Susana não tinha tido uma despedida de solteira, nem ela própria, permitira-lhe desfrutar daquela como bem lhe apetecesse, sendo o limite aceitar uma lapdance.

Uma hora mais tarde, o momento por que todos aguardavam. Guida confiava na loura para ter ajudado Rodrigo a encontrar Strippers decentes, enquanto ela faria o mesmo em relação aos Strippers masculinos, afinal, ali só a outra é que dispensava esses. Num bar popular, sentaram-se nos sofás, enquanto a empregada, com uma saia que passava por um cinto, trazia as bebidas. Os três despejaram-nas de penalti, como se fosse água, mandando vir a segunda. Quando chegou, as Strippers chegaram, também. Entusiasmada, a outra, que as escolheu mais pelos atributos, que pelo espectáculo, arregalou os olhos. Rodrigo, por seu lado, murmurou, de modo desagradado, “Mamas…”

Dando início ao número, uma das Strippers, subiu para o varão, sendo a única pessoa iluminada na sala escura. Lentamente, ora subindo o varão, ora caminhando de quatro pelo palco, foi tirando a roupa, muito para horror de Rodrigo que viu um fio dental aterrar-lhe na cabeça, de modo provocante. Nada além da rotina genérica, o que foi bastante enfadonho para Guida, que revirou os olhos. Ainda assim, colocou uma nota no peito da “dançarina exótica”, como eram oficialmente denominadas e apontou na direcção de Susana, sussurrando-lhe, “Acho que ela iria adorar que a entretivesses”

Ainda semi-nua, a stripper, aproveitando a dica de Guida, abordou a loura, com um sorriso travesso, debruçando-se sobre ela, quase sem deixar espaço entre as duas, “Estás a gostar?”

Com os olhos a saltar entre o peito e a cara da stripper, a outra, com um brilho suspeito no olhar, respondeu, sem deixar escapar a oportunidade, “Podia ser melhor”

“Hm, acho que tenho uma ideia”, picou a stripper, que colocou a mão no peito de Susana, fazendo-a recuar até ao sofá, não se abstendo de se lhe sentar no colo, eliminando qualquer distância. Durante os próximos momentos a loura, que não podia tocar, deixou a stripper fazer como muito bem entendesse, sempre com o contacto máximo e distância mínima.

Entretanto Guida, aborrecida pelo espectáculo genérico e, na sua opinião, mal executado, das Strippers, foi enchendo, até que ficou sem paciência. Para admiração de tudo e todos, arrancou o bigode postiço, levantou-se, dirigiu-se à stripper que estava no varão e disse, “Aprende que eu não duro sempre”

Se os espectadores estavam perplexos, mais ficaram quando, juntando o gesto à palavra, Guida, agarrando o varão, certificou-se que tinha a atenção de todos os presentes e deu início à sua demonstração. O certo foi que não desapontou, até Rodrigo estava de queixo caído. A loura, ainda a receber uma lapdance da stripper, pensou que naquele momento é que a sua vida estava completa, para tornar aquele momento excelente, só mesmo tendo Daniela ali. E por falar nela, nesse momento Rodrigo encostou-lhe o telemóvel ao ouvido, de modo a que ouvisse a rapariga perguntar, “Estás a gostar?”

“Oh sim”, respondeu a outra. Estava num ponto em que não tinha que esconder nada daquela noite à sua mulher, afinal ela própria acordara com tudo e não havia desconfortos de nenhuma parte. Disse, “Obrigada”
Para contentamento de Rodrigo, não um, não dois, mas três Strippers masculinos apareceram nesse momento. Como uma criança numa loja de doces, levou o seu tempo a apreciá-los enquanto faziam um número em todo semelhante ao das raparigas, abanando tudo quanto tinham para abanar. Quando um deles estava apenas de tanga, Guida, aproximando-se por detrás, puxou-lha para baixo, muito para delícia de Rodrigo e constrangimento da loura.

Susana não conseguiu aperceber-se de quanto tempo teria passado até que tudo aquilo descesse vertiginosamente o nível. O constrangimento que sentira ao ver o stripper nu pareceu insignificante ao que sentiu quando viu Guida, Rodrigo e os Strippers, tanto masculinos como femininos passassem, de toques indecentes a uma orgia ali mesmo à sua frente. Tentando concentrar-se nalguma coisa que não envolvesse Guida com um homem e uma mulher ao mesmo tempo ou Rodrigo com um deles de quatro à sua frente, enrolou uma e ajeitou-se no sofá, observando o desenrolar de tudo sob umas pálpebras pesadas. Ao seu lado, um dos Strippers sentou-se e ela, sempre disposta a partilhar, ofereceu a ganza, “És servido?”

“Se faz favor”, agradeceu ele, visivelmente contente, dando uns bafos, antes de devolver à loura, “Sempre quis fumar uma contigo”

“Na boa”, respondeu a outra, entre um bafo e outro. Verificando o telemóvel constatou que Daniela não lhe dava notícias desde a foto dela com a cobra que fazia parte do espectáculo de uma das Strippers da festa de Marta, ao pescoço. Enviou uma mensagem, a perguntar como é que as coisas estavam a correr e voltou a olhar para Guida e Rodrigo, suados e ofegantes, embora tivessem dado conta daquela gente. Depois do que tinham bebido e consumido, isto para não falar da proeza que fora a orgia, achou melhor dar a noite por terminado, agradecendo aos Strippers e encaminhou-os para o carro de Guida. À saída, consultou o telemóvel, vendo que a rapariga lhe contara como correra o resto da noite:

“Nd de maix, tavm qui mas gajax nuax e erva, nd de abuzado max axo que tou um cadinho indisposta loooooooooooooool”

Quando acabou de ler a mensagem, apenas implorou que a morena não pegasse no carro. Falando em carro, com Guida com o bigode falso colado à bochecha e semi-consciente e Rodrigo caído no passeio agarrado à sua perna, quem iria conduzir? Daniela tinha-lhe ensinado as bases da condução de um carro, se bem que do carro velho estilo executivo da rapariga para o jipe de Rodrigo fosse uma diferença considerável. Sacudindo Rodrigo da sua perna, decidiu-se. Pondo Rodrigo no banco de trás, onde ficou a babar os estofos e Guida ao seu lado, preparou-se para arrancar, ignorando e enxotando as mãos da amiga, “Hm Marta…”

Ao tentar meter primeira, o jipe deu um solavanco para trás, atingindo a parede. Mais desanimada, corrigiu a mudança até que conseguiu arrancar, mas não deixar ir abaixo e sem antes bater uma segunda vez. Com um espelho a menos e um farol partido, avistou a casa de Guida e, já a mandar foguetes por ter conseguido trazer o carro, decidiu travar. Vitoriosa, premiu um pedal a fundo…o acelerador. Em cheio no descapotável de Guida. Aquilo não podia ser verdade. Saiu do carro, ainda com a amiga a gemer disparates e fechou os olhos. Quando os abrisse a chapa estaria como no dia em que saiu da fábrica.

Ou não. Parece que ia ter que abrir os cordões à bolsa para cobrir aqueles arranjos todos. A mossa que lhe faria na carteira não era, de maneira nenhuma, tão grande como as que deixara no carro de Rodrigo e no de Guida, por isso encolheu os ombros. A muito custo, herculeano mesmo, levou-os para dentro. Vendo o telemóvel pela última vez, recebeu de Daniela:

“Agora é que foi loooooooooooooooool”

Após aquela noite, até tinha medo de saber o que se tinha passado. Atirando-se para a cama de Guida, deixou-se adormecer, mais tranquila.