quinta-feira, 11 de agosto de 2011

Capítulo 36

Ui, gostava de ter conseguido postar isto mais cedo, mas teve que ser reescrito várias vezes. Um bocadinho lamechas e tal...Fluffy time!

Até que enfim, um dia que aparentasse não ser tão tempestuoso como os que o antecederam, mesmo que o frio cortante ainda se fizesse sentir, não havia vestígios de intempérie. Pena que, para Daniela esta manhã tivesse que ser passada na faculdade, em vez de por entre os lençóis. Foi através de olhos semi-cerrados e nariz torcido que atravessou o percurso que englobava a distância entre a saída do metro, sobrelotado por todo o tipo de pessoas e odores corporais, até à entrada do edifício da faculdade, onde encontrou um grupo de pessoas do seu ano e com quem se dava bem. Dirigiu-se a eles e cumprimentou-os, mesmo que grandes grupos nunca a deixassem à vontade, mas acima de tudo prezava a boa educação.
Houve apenas tempo para conversa de circunstância e um cigarro, visto que a campainha tocou, dando inicio a mais um dia de aulas. Mesmo estando ensonada, a morena fez todos os possíveis para prestar atenção às aulas, afinal ao menor deslize as facas reservadas para Susana, passariam a ser para si, cortesia da severidade dos seus pais. Estava a passar uns apontamentos, quando sentiu o telemóvel vibrar-lhe no bolso, assinalando uma mensagem recebida, mensagem essa que previa ser da loura, já que era aquela a hora a que acordava.
Desde toda aquela situação com Mariana que Susana andava particularmente carinhosa e atenciosa para com Daniela, talvez quisesse assegurar a esta que não precisava de se preocupar com a outra ou talvez se sentisse apenas grata pela forma como a namorada lidara com o que se passara e queria retribuir, ambas as hipóteses eram boas. Já a rapariga, por sua vez, continuava a mesma, propositadamente, nada de carinhos especiais, nada de fiscalizar as acções da loura, a última coisa que queria era que esta a visse como insegura.
No entanto aquele dia teria que ser diferente, mais que não fosse porque faziam oito meses. E o que tinha planeado? Ora bem, dado que tinha perdido o dia de S. Valentim graças ao trabalho da faculdade e por Susana ter que ficar no bar durante aquele dia, também este muito rentável, tinha que compensar. Como até estava um dia razoavelmente bonito, talvez fossem lanchar a um local muito do seu agrado, afinal a loura não era esquisita e onde quer que estivesse comida estava bem para ela. Sorrindo para si, pegou no telemóvel, conseguindo não ser apanhada pelo professor. Uma vez com o aparelho escondido por trás da mala, preferiu esperar um bocadinho, para prolongar a sensação de euforia, quem mais a reduziria a pita do básico se não Susana? Demasiado curiosa, cedeu:
“8 meses mas parece ser o primeiro, tivemos os nossos maus momentos, mas acabámos sempre bem e foram muitos mais os bons *.* No que depender de mim hão de se seguir muitos mais! Amo-te princesa <3”
Por muito que Daniela revirasse os olhos e abanasse a cabeça, o certo era que no fundo até gostava da loura, só não o podia mostrar, afinal era a sua reputação que estava em risco. Sufocando tanto o risinho que lhe subiu aos lábios, como as “borboletas”, no estômago, expressão que odiava, respondeu:
“É mesmo incrível tudo o que aconteceu nestes 8 meses e, apesar de tudo, aqui estamos nós…não mudaria nada, foram melhores que tudo o que poderia esperar J …quer dizer, estava tudo bem até à parte da princesa -.- enfim, amo-te na mesma”
Para sua satisfação, a campainha tocou, dando o seu dia por terminado. Contendo o seu entusiasmo, a rapariga despediu-se dos colegas, fugindo às perguntas da praxe sobre o seu estado mais alegre que o habitual. Não era que quisesse esconder a sua relação com Susana, apenas não achava que os colegas fossem o tipo de pessoas com quem partilhar aquela informação fosse boa ideia, por muito que gostasse da companhia deles. Isso e já confiara em pessoas erradas no passado, coisa que tencionava não repetir. Uma vez no caminho para casa, permitiu-se a trautear uma música que lhe ficara no ouvido, coisa que só fazia quando se encontrava particularmente feliz.
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“Suse”, acordou-a a avó, afagando-lhe o cabelo desalinhado de uma madrugada de sono. A única resposta que obteve surgiu, muito a custo e abafada por entre os lençóis, sob a forma de um resmungo ensonado. Havia vinte e um anos que aquela cena de desenrolava, a neta nunca fora de madrugar a não ser que fosse à praia, para isso estava sempre pronta e era a principal entusiasta. Sorrindo, a idosa voltou a tentar, cheia de paciência, “Vá Susana, já são onze horas”
“Eish…já?”, protestou a loura, enquanto enterrava ainda mais a cabeça na almofada. Chegara a casa por volta das sete da manhã, como era hábito, e, em condições normais iria dormir até tarde, mas combinara com Daniela encontrarem-se em casa desta à hora de almoço e iria preferir cortar o próprio braço com uma serra ferrugenta do que faltar à sua palavra, mais que não fosse porque faziam oito meses. E mesmo que não fizessem…
“Olha que não tens tempo”, continuou a idosa, nunca deixando de passar as mãos pelas madeixas louras da neta. Sempre achara impressionante o facto de o cabelo desta se manter macio e sedoso apesar das várias…como é que se chamavam? Rastas…ou o que quer que fosse que Susana lhes chamava. Era com alguma pena que via o ondulado dourado do cabelo da neta terminar em tubos de cabelo emaranhado na parte de trás, mas dava muitas graças a Deus por esta se ter ficado por aí.
Quando finalmente viu que conseguira despertar a loura, dirigiu-se à cozinha, para lhe preparar alguma coisa para comer, mas não sem antes lhe dar um beijo na testa, de bons dias, sendo retribuída por um sorriso e um afagar dos seus dedos massacrados pela idade. Já sozinha, Susana empurrou os lençóis de cima de si, ficando sentada na cama, enquanto lutava o torpor que se lhe apoderara do corpo. Os últimos dias haviam sido cansativos, sobretudo com o dia de S. Valentim, dia esse que não pudera passar com a namorada. No entanto, se havia algo pelo qual estivesse muito grata, era, sem dúvida, pelo facto de Mariana se ter mantido à margem nos últimos tempos, talvez por vergonha.
Mas como não queria pensar nela naquele dia, bem bastava ter que a ver mais tarde à noite, afastou-a dos seus pensamentos. Depois de ter o banho tomado, dirigiu-se à cozinha, onde uma taça de cereais a esperava. Estava a deliciar-se, comendo com colheradas generosas, quando a avó se manifesta, “Cuidado ou vais deixar uma mancha na camisola”
Tendo em conta que Susana estivera a escolher a roupa com cuidado, a última coisa que queria era deixar uma mancha de leite e “Chocappic”. Num ápice, sorveu o que restava do leite no fundo, até que se deixou encostar para trás na cadeira, saciada, “Tudo sob controlo avó”
“Linda menina”, mimoseou a idosa, limpando o canto da boca à loura com um guardanapo, tal como fazia nos tempos em que esta ainda era menina, “Vais ter com a Daniela agora?”
“Claro, hoje fazemos oito meses, ainda para mais não tenho estado com ela”, informou, sorridente.
“Fico feliz por estar a correr tudo bem entre vocês”, regozijou-se a senhora, sorrindo enternecida. Nos seus olhos azuis, havia um brilho recuperado, como se revivesse o que não pudera ter através da neta.
“Obrigada”, disse a neta, cujo apoio da avó, o melhor leito de carinho e conforto, sempre se revelara indispensável. Já era tempo de se pôr a caminho. Despediu-se da idosa com um abraço e uma promessa que iria guiar com cuidado e fez-se à estrada.
Mesmo tendo encontrado algum trânsito, não demorou muito até que já pudesse avistar a casa de Daniela. Assim que arrumou a mota e se aproximou do portão, a cadela irrequieta da rapariga saudou-a alegremente, abanando a cauda e saltitando. Estava já com a mão dentro do portão para afagar o pêlo do animal, quando a morena abriu a porta. Assim que a viu, a irrequieta Tica teve que abdicar da atenção que estava a receber a favor da dona. Daniela correu a distância entre elas, aproveitando o balanço para lhe colocar as pernas em torno da cintura. Por um breve instante ainda teve receio que a outra não aguentasse e que fossem cair as duas, mas não havia nada a temer, Susana nem pareceu muito incomodada com o esforço, “Estás mesmo feliz por me ver”
“Não te estou a pesar muito?”, perguntou ainda a rapariga, preocupada.
“Tu és leve que nem uma pena”, assegurou a loura, confiante na sua condição física, “Ahm, não são só os abdominais que tu adoras, confessa lá”
“É também essa tua modéstia”, replicou Daniela, num tom que enfatizava a ironia. Porém, não se admirou muito, quase nada aliás, quando a outra a pousou no muro, parecendo muito aliviada, “Agora dói, não dói?”
“Cala-te”, retaliou Susana e, juntando o gesto à palavra, beijou a morena, silenciando-a definitivamente. Quando esta a afastou um pouco percebeu que se deixara entusiasmar e que já havia pousado as mãos onde não devia, em público, claro, “Ups, sorry”
A rapariga limitou-se a rir, antes de a abraçar ternamente. Dado que os pais de Daniela já haviam saído de casa e só estariam de volta tarde, tinham a casa só para elas. Mais que não fosse porque os planos de ambas de passarem a tarde fora tiveram que ser descartados, uma vez que o sol e a temperatura amena da manhã se esconderam por detrás de uma camada espessa de nuvens de cor pouco convidativa. Ignorando os “desde que estejas comigo não me importa onde ficamos” e tiradas semelhantes da outra, a morena propôs que fossem almoçar, antes que a sucessão de “mel” à qual estava a ser sujeita lhe tirasse o apetite. Por muito que a loura se divertisse com as expressões de náusea e as obscenidades vocalizadas pela namorada, o seu estômago falou mais forte.
Claro que para isso ainda tinham que cozinhar. Conforme o que havia à sua disposição, Susana propôs ensinar a Daniela um prato novo. Uma vez postos à mão os ingredientes, colocou-se por trás da morena, pegando-lhe na mão e ensinando como bater os ovos, tal como a avó lhe ensinou. Interrompeu apenas o que estava a fazer para desviar o cabelo da rapariga, para lhe mordiscar ao de leve o pescoço, sabendo o quão sensível a cócegas esta era. Entre risinhos, Daniela levou os dedos à farinha, antes de se virar bruscamente, deixando quatro traços brancos na bochecha de Susana.
“Logo a atacar, tu”, disse a loura, com o seu melhor beicinho, na esperança de comover a morena. Quando viu que esta até parecia enternecida e de defesas baixadas, deixou lentamente descair a sua expressão de cachorrinho para uma de travessura, ao mesmo tempo que a de derretida da rapariga dava lugar a uma assustada. Agarrou-a pela cintura, apesar dos melhores esforços dela para escapar, fazendo cócegas em tudo o que conseguia apanhar, deixando-a a chorar de tanto rir e a implorar que a deixasse respirar, “Não pensavas que eu ia deixar passar essa, pois não?”
“Aii…pára! A sério…Susana…”, lá ia indo suplicando Daniela, já vermelha do esforço e da falta de ar, “SUSANA!”
Quando sentiu que se tinha vingado o suficiente, Susana finalmente largou Daniela, mas não sem antes lhe dar um beijinho de consolo, ao qual esta respondeu com um gesto desagradável com o dedo, o que resultou numa explosão de risos por parte da loura. Assim que os ânimos de ambas acalmaram, puderam finalmente acabar de cozinhar o almoço, em sossego. Já cada uma com o seu prato diante de si e com o som das gotas da chuva a embaterem na janela a funcionar como música ambiente, deixaram-se ficar, sem conversar, apenas desfrutando do ambiente apaziguante e da companhia uma da outra.
“Afinal ficou bom, vês?”, disse a loura, com a boca cheia, quebrando o silêncio.
A morena limitou-se a anuir, um tanto dispersa no seu mundo. A prenda que tinha para a outra trouxera-lhe ao de cima um receio com que já andava há algum tempo. Era para lhe perguntar antes, mas nunca arranjara coragem. Mais valia não adiar mais. Pousou os talheres e perguntou, “Olha…nunca mais…drogas pesadas, pois não?”
“Hm?”, balbuciou Susana, apanhada de surpresa com a brusquidão com que lhe fora feita a pergunta, tanto que gaguejou um pouco, “N-não”
Daniela não pareceu muito convencida, mas preferiu deixar o assunto morrer, não querendo matar ainda mais o momento. Desviou o assunto para uns mais seguros e agradáveis, sendo bem sucedida, pois a outra continuou o seu “eu” habitual e animado. Depois de comerem, lavaram a louça e ponderaram o que iriam fazer a seguir. A escolha recaiu numa comédia que a rapariga tinha algures esquecida pelos recantos da casa. Uma vez posto o DVD no aparelho, recostaram-se no sofá, com a loura a aconchegar a morena nos seus braços, enquanto lhe sussurrava ao ouvido, “Diz lá que estas não são as melhores almofadas de sempre”
“Cala-te ursa”, replicou Daniela, beliscando a perna de Susana, sem ligar nenhuma ao gemido de dor desta. Porém, acabou mesmo por se acomodar melhor no peito da loura. A outra, por sua vez, colocou-se de modo a puder aconchegar a rapariga nos seus braços, ao mesmo tempo que com uma mão lhe afagava o cabelo. E o certo era que a morena não se queixava, mesmo que os seus planos tivessem ido pela sarjeta abaixo, juntamente com a chuva. Apertando-se mais contra a loura, sorriu para si, sentindo-a dar-lhe um beijo na têmpora.
Quando o filme acabou, depressa demais para o gosto de ambas, Daniela pediu a Susana que esperasse um pouco. Num ápice, foi ao quarto buscar a prenda que tinha, prenda essa que havia comprado mais por achar que era mesmo a cara da namorada do que por ser alguma ocasião especial. Ao presentear a loura, o ar melancólico e abatido desta não era exactamente a reacção por que esperava, “Então, não gostaste?”
Em bom rigor, a outra adorara a sweater, tinha uma estampa que adorava que consistia numa folha de cannabis e uma inscrição que dizia “I´m Green”. E mesmo que não fosse mesmo ao seu gosto, era uma prenda da namorada, até podia ser uma camisola de lã cheia de borbotes que para si estava óptima. Com um suspiro, optou por ser honesta, “Não te comprei nada, este mês estivemos mesmo mal de dinheiro com os medicamentos da minha avó…desculpa”
Mesmo que conseguisse, a rapariga nunca se iria chatear, mesmo que não estivesse ao corrente das dificuldades financeiras da loura, mesmo que esta não lhe oferecesse pequenas coisas, bastantes vezes até, a morena não esperara nada em troca, apenas achara que Susana iria gostar da peça de roupa. Sorrindo-lhe, disse-lhe isso mesmo, antes de a abraçar e garantir que a prenda era o menos e que estava grata por tudo.

1 comentário:

  1. Adorei !
    Apesar que ainda me "cheira" que a Mariana não tenha desistido tão facilmente.
    Uma vez mais, a cumplicidade que as duas têm, é de ficar deliciada a ler :)
    E quanto à avózinha ternurenta da Susana, continuo a ter uma espécie de carinho por esta personagem :)
    Valeu a pena a espera por mais um!
    Uma viajante dos blogues :) *

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