segunda-feira, 5 de setembro de 2011

Capítulo 52

Mesmo sem querereres, deste-me uma ideia, viajante. Obrigada :D

“Bom dia, linda!”, saudou a mulher loura cujo título de mãe na vida de Susana pouco ou nada tardou a recuperar. E esta mal podia crer na sua sorte, por muito que o toque gentil das mãos desgastadas pelo trabalho que outrora pertenceram à sua avó proporcionassem um despertar aconchegante, não eram comparáveis, de modo algum, às de toque macio como cetim da mãe. Por muitas vezes que a senhora a acordasse, mimando-a, aqueles afagos e beijinhos carinhosos nunca cessaram de a fazer sentir-se tão eufórica que se sentia como se tivesse um balão dentro do peito.
“B’dia, mãe”, retribuiu Susana, erguendo-se da almofada, o suficiente para dar um beijinho afectuoso na bochecha da mãe. A senhora sorriu em resposta, antes de colocar um tabuleiro com o pequeno-almoço no colo da filha. Era um gesto que já vinha a fazer desde que se mudara com o marido para casa da loura. Sabia o quanto esta era vulnerável a pequenos gestos, sempre o fora desde criança, então nessa altura era mais sensível e particularmente propícia a choros. Lembrava-se de um episódio, a filha devia ter aí três anos, quando estava ainda a tentar aprender a andar de bicicleta mas caíra, ferindo o joelho. Não cessava de chorar, agarrada à camisola da mãe, mesmo depois de tratada a ferida, só parando quando esta a senhora a embalara e lhe prometera que iria passar.
Por sua vez, Susana nunca havia mudado, intrinsecamente continuava a mesma pessoa sensível mas o efeito do passar dos anos não fora meigo com ela e que remédio tivera senão calejar. No entanto, aquele carinho que só os pais sabiam dar era algo do qual já não se recordava e tencionava aproveitar tanto quanto pudesse. Assim sendo, não foi de estranhar a facilidade com que acolheu aqueles dois indivíduos na sua vida. Desfrutou, naquele dia, tal como havia vindo a fazer, da companhia da mãe enquanto tomava o pequeno-almoço na cama. Quando já se encontrava despachada, saudou o pai com um abraço apertado. Ao separarem-se, viu reflectido no rosto do pai um sorriso idêntico, com as mesmas covinhas pronunciadas e brilho nos olhos azuis.
“Estava aqui a falar com os teus irmãos”, perguntou o senhor, estendendo o telefone para a filha. Os irmãos desta haviam ficado em casa de uns amigos da família durante a ausência dos pais, “Queres-lhes dar uma palavrinha?”
“Sim…pode ser”, concordou Susana, um tanto a medo. Já apanhara do ar algumas conversas entre os pais e os irmãos mas nunca antes lhe haviam proposto falar com eles. Num tom de voz abafado de tanto conter a ansiedade e sem saber exactamente o que dizer e como o dizer, tentou, “Olá?”
“H-Hallo…”, cumprimentou a irmã mais nova, a Carolina, timidamente, na sua voz fininha, “Wie geht’s dir?”
Os pais tinham-lhe dito que apenas o mais velho arranhava razoavelmente português, os mais novos não passavam da única língua a que estavam habituados no país onde nasceram. Com a ajuda dos pais, a loura conseguiu formular uma resposta, o melhor que conseguiu, “Gut danke”
Como reacção, tanto dos pais, como da irmã obteve uns risinhos bem-dispostos, “Oh estive assim tão mal?”
“Não querida, foi uma boa tentativa”, consolou a senhora, dando-lhe um beijo na testa. Pegando ela própria no aparelho, pediu à filha mais nova que passasse ao irmão, para que Susana lhe pudesse falar sem a barreira da língua.
“Ôlá”, cumprimentou o rapaz, cuja voz grossa se encontrava submergida por um sotaque extremamente pronunciado, “Astás boua, mana?”
“Olá Duarte, estou sim e tu?”, disse Susana, mal cabendo em si de contente. Esperara por aquele momento desde que soubera que tinha um irmão.
“Também…”, replicou ele, com uma nota de felicidade presente no timbre da voz, “O Brüno astá a dizer olá”
“Beijinhos para ele também”, retribuiu a loura, agora incapaz de esconder mais o sorriso enorme que ostentava. Infelizmente para si não podia ficar muito mais, tinha que ir ao estúdio ou o seu produtor decapitá-la-ia. Se havia algo que lhe servia de consolo era a promessa de que oportunidades para conhecer melhor os irmãos. Despediu-se deles, não deixando de referir o quanto gostara de ter podido, finalmente, falar-lhes.
Não podendo adiar mais, disse adeus também aos pais, tão calorosamente como os havia cumprimentado, antes de dar início a mais um dia de trabalho.
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“Já nem tens tempo para me dizer olá!”, queixou-se Guida, enquanto ia, juntamente com Susana, para um restaurante nas imediações do estúdio desta. A agenda preenchida da sua melhor amiga tinha vindo a impossibilitar que se encontrassem, mas Guida facilmente contornara isso fazendo uma emboscada à outra na sua hora de almoço. Na sua tão característica atitude gozona, continuou, “Enquanto não tiveres meninas a atirarem-te com o soutien para cima não és mais importante que eu”
“Ai cala-te, às vezes aparece-me cada uma…se eu não fosse comprometida…”, suspirou a loura, recordando um encontro com uma fã particularmente “caliente”, “E tenho sempre tempo para ti, não te preocupes”
A amiga riu-se ao imaginar Susana toda constrangida a ter que tirar os olhos de cima de uma rapariga semi-nua atiradiça. De súbito, ficou outra séria, antes de perguntar, “Achas que a Daniela se importava muito que tu tivesses assim…uma aventurazinha por fora?”
Uma coisa era certa mas não sabida, Susana já estivera tentada mesmo muitas vezes, até porque os hábitos antigos não se perdiam assim da noite para o dia e então quando juntado ao facto da sua incessante popularidade, as escolhas aumentaram drasticamente, tanto de quantidade, como de qualidade. Não que no passado tivesse sido problema, afinal estava habituada a arranjar uma sempre que queria. Quanto à reacção de Daniela caso a loura cedesse à tentação…mesmo sendo uma caixinha de surpresas, era seguro afirmar que a rapariga castrá-la-ia.
“Eu ia ter uma morte lenta, na melhor das hipóteses…”, respondeu a outra, arrepiando-se só de ponderar o assunto, “Mas nunca falei com ela sobre isso”
“Olha, porque é que não falas?”, propôs Guida, com uma expressão matreira, “Ainda podias ser surpreendida”
A conversa teve que ser interrompida, com a chegada da empregada com os pratos de ambas. Como sempre, Susana começou a inalar a comida, ignorando a amiga, até que esta a pisou por baixo da mesa, “Ah! Foda-se…essa merda doeu”
“Mas vá, admito que já estive quase, quase a não conseguir aguentar”, confessou finalmente a outra, “A Dani é que não precisa de saber e não vou falar com ela sobre isso”
“Devias falar, ela ia tentar compreender”, insistiu a amiga, cujo sorriso não parava de crescer.
“Está fora de questão”, replicou a loura, não desejando falar mais no assunto, “Tanta insistência…”
“Sim, eu conheço-te e não sei como é que ainda não encornaste…”, tentou Guida, revirando os olhos”
“Uma aventurazinha, como tu lhe chamas, não vale pôr o meu namoro em risco”, respondeu Susana, cada vez mais incomodada. Para seu alivio, chegou a empregada com a conta, o que dirigiu a atenção da amiga. Quando abriu a carteira constatou que esta se encontrava vazia, quando ia jurar que ainda no dia anterior tinha um par de notas. “Uh…Guida, acho que vais ter que me fazer um favor”
“Desde que não seja para te limpar o cu…”, disse Guida, a eterna temperamental.
“Eu sei que tinha aqui uns vinte euros, mas agora está vazia”, resmungou a loura, acenando com a carteira na cara da amiga, “Eu prometo que te devolvo”
“Estás toda frita, já nem sabes o que tens”, grasnou a amiga, mesmo que tivesse atirado ela com uma nota para o pequeno prato.
A hora de almoço de Susana estava a acabar, o que fez com que tivesse que regressar. No caminho para o estúdio, a loura tentou lembrar-se de sítios prováveis para ter deixado a carteira, mas sabia que a tinha deixado em cima da secretária em casa, não era possível o dinheiro ter desaparecido assim. O roçar da mão de Guida na sua fê-la despertar, como um choque, “Ahm…?”
“É bom que não me estejas a olhar para as mamas”, zombou a amiga, antes de se inclinar para se despedir. Quando o fez, colocou a mão por baixo do peito da outra, o que disparou o ritmo cardíaco desta, “Adeusinho”
Para trás ficou uma Susana tão baralhada que ficou imóvel, a olhar para o vulto da amiga que se afastava.

1 comentário:

  1. 1º - Aposto que o dinheiro desaparecido foram os pais!
    2º - O que foi aquilo da Guida ? A rapariga passou-se ? :o
    Quero mais !
    Uma viajante dos blogues :) *

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