domingo, 4 de dezembro de 2011

Capítulo 79

“Os filhos do Pedro acabaram de nascer”, ouviu Susana, sentindo um sorriso desenhar-se-lhe nas feições. Mesmo não sendo seus, uma alegria enorme percorreu-a toda, como se tivesse um balão dentro do peito. Radiante, perguntou, “Então? Quando é que os vamos ver?”
“Suponho que os possamos ir ver lá para o final da tarde…”, anuiu Daniela, mordendo o lábio inferior até o sentir ensanguentado. Já nada podia fazer para impedir o desastre que seria quando a loura visse as crianças, em toda a sua fofura recém-nascida. E pensar que tudo o que tivera de ouvir por parte da outra, desde nomes possíveis a brincadeiras que já imaginava com as crianças, não seria nada quando comparado com o que iria ter que ouvir.
Soltando um risinho de entusiasmo, Susana, ainda a emanar felicidade por todos os poros, pegou na rapariga pela cintura, elevando-a, antes de a rodopiar no ar, alegremente, “Qualquer dia somos nós!”
Por muito que só a ideia a fizesse ter vontade de ir para um canto chorar em posição fetal, a felicidade da loura nunca deixaria de afectar a morena, a ponto de sorrir também. Apoiando os braços sobre os ombros da outra, deu-lhe um beijinho à esquimó, “Veste-te enquanto eu vou fazendo o almoço, ainda temos a tarde toda para matar saudades”
Susana pousou-a no chão, delicadamente, antes de lhe dar um beijo. Enquanto se vestia, a morena foi preparando as coisas para o almoço, não faria nada elaborado, mas seria do agrado da outra. Tinha já tudo quanto iria usar em cima da mesa, quando a loura entrou na divisão, com a intenção de ajudar. Daniela não queria senão mimá-la, portanto disse-lhe, “Não te preocupes, senta-te que eu trato disto”
A outra deu-lhe uma palmada no traseiro, bem-disposta, e dirigiu-se ao frigorífico, feliz por verificar que a sua grade ainda lá estava, mais fresca que nunca. Retirando uma garrafa, disse, “Não gostas mesmo de cerveja, pois não?”
“Ahm?”, respondeu a rapariga, enquanto temperava a comida, “Não gosto nem de cerveja, nem de derivados, mas acabei com o resto de erva que tinhas…desculpa, mas não tinha outra forma de manter a sanidade”
“Tranquilo, arranjo mais”, replicou Susana, por entre tragos, aquela devia ser a única situação em que preferia louras a morenas, a seu ver, não havia melhor que uma loura bem fresquinha, “Aquela cabra lá do escritório…a Ana, ou caralho que se chamava, deu-te muita chatice?”
“Na verdade já é o pão nosso de cada dia”, suspirou a morena, descarregando a frustração nos bifes, que bateu com toda a força, “Outro dia perguntou como é que iam os teus chatos…disse-lhe que estavam bem e que também mandavam cumprimentos”
A loura riu-se, quase engasgando-se com a cerveja. Assim que acalmou e recompôs, perguntou, séria, “Queres que tenha uma conversa com ela?”
“Não é preciso, ela deve estar agora a raspar os fungos da rata”, resmungou Daniela, enquanto punha o almoço em cima da mesa, ao mesmo tempo que a outra terminava a cerveja, com um arroto indiscreto.
“Cheira bem”, comentou Susana, enfiando o nariz na periferia do prato, já sentindo a água a crescer na boca.
“Não estavas cá, tive que aperfeiçoar os meus dotes culinários”, respondeu a rapariga, confiante da sua técnica, servindo-se, tanto a si própria, como à loura.
“Não foi só com a comida”, brincou a outra, entusiasmada, tanto que fazia estremecer a cadeira, “Vi o ursinho!”
A morena deu-lhe um chuto, acertando-lhe numa canela, causando dor suficiente para que Susana gemesse, “Não ia gozar…é bem fofo!”
“Ao menos o ursinho não diz asneiras”, retribuiu Daniela, dando um soco na brincadeira à loura, “Nem ressona”
“Eu não ressono!”, contra-atacou a outra, indignada, agarrando o braço da  morena, “Ou se calhar um bocadinho...não interessa! Conta lá, como é que te aguentaste sem mim? Dedo no grelo o tempo todo?”
“Resolvi bem o assunto sozinha, se é isso que queres saber”, admitiu a rapariga, retirando o braço e levando a esparguete à boca, como se fosse o tema mais apropriado para se debater à hora da refeição.
“Nem queiras comparar”, disse logo Susana, com a boca cheia, fulminando a morena, “Comigo até fazes a esparregata, se for preciso”
“A esparregata…alguém está a ficar muito convencida”, espicaçou a morena, revirando os olhos, em gesto de gozo.
A loura limitou-se a acenar para que esperasse e a acabar a refeição em silêncio, muito para diversão de Daniela, que a continuou a picar. Assim que a rapariga se levantou para colocar os pratos em cima do balcão, a outra atira com ela de costas para cima da mesa, prendendo-lhe os pulsos por cima da cabeça, “Não sou assim tão boa, hm?”
Juntando o gesto à palavra, apoderou-se do pescoço de Daniela, ocasionalmente mordendo-o, com força suficiente para deixar uma ferida. Puxando-a para si, beijou a rapariga, com alguma brusquidão, antes de a voltar a atirar para trás, desta vez fazendo com que a mesa cedesse e fosse abaixo. Mas eram pormenores, nada que valesse a sua atenção. Por cima dos escombros, a outra, rasgou o top da morena, aproveitando a pele exposta para atacar, deixando marcas por onde passava. E Daniela? Essa adorava sempre que Susana era bruta, valia bem a pena os cabelos arrancados e as marcas.
A expressão de determinação da loura, de sobrolho franzido e ponta da língua de lado enquanto lutava com o botão dos calções da rapariga fez com que esta não conseguisse conter o riso, o que provocou ainda mais a outra, “Estás-te a rir? Agora vais de quatro”
Tomando a iniciativa, virou Daniela de costas para si e, com uma mão fez o que tinha a fazer, fazendo com que a rapariga gemesse e, com outra, agarrou-lhe o pescoço, pondo-lhe quase a cabeça em cima da mesa. Aquilo era algo que nunca tinha feito, portanto a morena sentiu algum pânico ao não conseguir respirar. Susana não parou, apertando cada vez mais, sem cessar mesmo quando Daniela lhe tentou afrouxar o aperto. No entanto, mesmo que estivesse assustada com toda aquela situação, não conseguia evitar adorar o que a loura lhe fazia com a outra mão, tanto mais que já fechara os olhos, estava tão perto e a outra sabia-o.
No momento em que a rapariga atingira o clímax, a outra largara-lhe o pescoço. O súbito fluxo de oxigénio intensificara-lhe o orgasmo para o dobro, o que fez com que a morena em vez de gemer, gritasse, antes de se deixar cair, inspirando profundamente, “Tu…isto podia…ter corrido tão mal”
“Magoei-te muito?”, perguntou Susana, dando um beijo na bochecha de Daniela, “A Guida é que me deu a ideia, ela adora estas coisas esquisitas e garante que se for bem feito é óptimo”
“É óptimo, a sério”, esclareceu a rapariga, massajando o pescoço, com os olhos vidrados, “Só que assustaste-me mesmo”
“Tu sabes que eu não te ia fazer isto com intenção de te magoar”, disse a loura, sentindo-se incomodada.
“Eu sei”, assegurou a morena, beijando a outra, antes de a abraçar, “Um dia repetimos e vês por ti própria”
Quando sentiu os restos mortais da mesa debaixo de si, afastou Susana, “A mesa…tu partiste mesmo a merda da mesa”
“Olha bem para a minha cara de preocupada”, replicou a loura, encolhendo os ombros, antes de se voltar para Daniela, sugestivamente, “E retribuíres?”
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Estar por cima do cadáver de uma mesa esconjurada a trocar mimos nunca poderia ser considerado o paradigma de uma tarde romântica mas Daniela não se queixava, Susana era definitivamente confortável que chegasse. De dedos entrelaçados, a loura aproximou-se da rapariga, beijando-a, “Amo-te”
“Eu sei”, brincou a morena, antes de ter sido interrompida pelo som do telemóvel a tocar em cima do balcão. Refilando, levantou-se, muito para desconsolo da outra e viu quem se tratava, era Pedro. Atendeu, “Então daddy?”
Susana levantou-se com a velocidade de um boneco de mola, só lhe faltava crescer cauda e começar a abaná-la. Escutando a conversa de Daniela, captou a parte que mais lhe interessava, “Sim, estamos aí daqui a nada”
“Vamos ver os meninos?”, perguntou, rejubilante, já de pé.
“Sim…veste-te e vamos”, suspirou a rapariga, desanimada. E assim começava a sua desgraça, pelos vistos. Enquanto a loura se vestia à velocidade da luz, a morena dirigiu-se ao quarto para procurar uma indumentária nova, tendo em conta que a que tinha anteriormente ficara destruída. Ignorando os incentivos da outra para que se despachasse, levou o seu tempo, compondo-se. Quando se observou ao espelho, ficou horrorizada, tinha um golpe no lábio e as marcas dos dedos de Susana estavam bem visíveis no seu pescoço.
“Rápido!”, chamou a loura, puxando-a pelo braço, encaminhando-a para a mota, que a seu ver seria muito mais veloz que o carro. De nada valeram os protestos da morena, foi num ápice que deu por si na sala de espera da ala de obstetrícia, onde estava Pedro. Se havia alguém mais entusiasmado que a outra, seria ele, que parecia ter ganho a lotaria.
“Olha a madrinha!”, saudou ele, tão alegre que saltitara, até se atirar que nem um torpedo, para cima de Daniela, atirando-a ao chão, “São tão lindos! A minha Maria João vai ser tão menina do papá!”
“Sim papi, estou a ver que sim”, tentou a rapariga, de tudo fazendo para o tirar de cima. Quando a enfermeira lhes foi pedir que fizessem menos barulho, o rapaz não teve opção senão levantar-se. Ainda a transpirar felicidade, encaminhou-as para o quarto onde estava Cláudia com os filhos, um de cada lado. De onde estava, a morena não conseguia ver muito mais que dois volumes debaixo de umas mantas, porém, quando se aproximou, observou duas crianças recém nascidas que deveriam, muito provavelmente, ser as mais adoráveis que alguma vez tivera a sorte de ver.
Com os seus cabelos claros, macios como uma pluma, eram a imagem fidedigna um do outro. Ambos com a pele rosada, grandinhos e rechonchudos, estavam profundamente adormecidos. Cláudia, apesar do seu ar estafado, era a perfeita personificação da felicidade. Olhando para Susana, Daniela não pode deixar de reparar na adoração com que olhava para as crianças, com um sorriso ligeiro e um brilho no olhar. Cláudia deve ter reparado, pois ofereceu, “Não quer pegar?”
Quem a observasse diria que lhe tinham oferecido um milhão de euros. A loura pegou no que se encontrava mais próximo, João Pedro, tão cuidadosamente como se fosse feito de cristal, e encostou-o a si, derretida. O bebé, que acordou, começou a chorar, muito para susto dos pais. Mas a outra, não pareceu minimamente incomodada, recostou-o melhor e, embalando-o um pouco, sussurrou qualquer coisa que a rapariga não entendeu, mas que pareceu acalmar o miúdo.
“Tem muito jeito para crianças”, comentou Cláudia, sorrindo. Voltando-se para a morena, perguntou, “E tu Daniela? Não queres pegar num?”
A morena olhou para a expressão sorridente da namorada do amigo, depois para este, que acenou em encorajamento e, por fim para Susana que deu um beijo na testa do bebé e lhe sorriu. Engolindo em seco, Daniela, pegou em Maria João, que emitiu um som abafado, o que assustou a rapariga que olhou para o resto das pessoas no quarto, em busca de conselhos. A loura, vendo-a aflita, disse, “Estás a ir bem, não é preciso teres medo”
Respirando fundo, a morena embalou um pouco a bebé, sentindo aquele pequeno corpo quente contra si. Quando Maria João acalmou, Daniela permitiu-se a descontrair, afagando a mãozinha da menina que pendia ao lado desta. Talvez conseguisse dar conta do recado de uma sua e de Susana. Ok de onde é que aquele pensamento aparecera? Sorrindo para si, voltou a despertar quando sentiu a mão da bebé fechar-se sobre o seu dedo, “Oh”
“Acho que ela gosta de ti”, regozijou-se Pedro, ao ver o momento partilhado entre a madrinha e afilhada.
Entretanto apareceu a enfermeira, a espumar por cansarem a mãe daquela maneira. Despedindo-se, um tanto à pressa, a rapariga disse, “Parabéns, são lindos”
“Saem ao pai”, brincou o amigo, piscando o olho, “Agora bazem!”
Rindo, Daniela e Susana abandonaram o quarto, caminhando para a saída. Enquanto a loura disparava um discurso enorme sobre o quão bonitos eram os recém-nascidos, a rapariga reflectia. Aqueles dois, tão adoráveis, tão frágeis, com tantas características tanto de Pedro como de Cláudia tinham mexido um pouco consigo, quer quisesse admitir, quer não. Assim que estavam fora do hospital, tocou com a mão no braço da outra, “Susana…”
“E eles têm um narizinho tão querido!”, continuou Susana, antes de se interromper, “Hm? Estou-te a aborrecer com a conversa, não estou?”
“Não…”, disse a morena, “Olha, talvez crianças não sejam assim tão más…”
A loura deteve-se, olhando para Daniela como se estivesse a ver Deus, chegando mesmo a agarrar-lhe o braço, “Tu disseste mesmo isso?”
“Sim…acho que podíamos pensar nisso”, confessou a rapariga, corando um pouco. Ao sentir a mão da outra apertar-lhe o braço, queixou-se de dores. Quando Susana lhe foi inspeccionar o braço, viram marcas explícitas dos dedos da loura, espalhados por toda a extensão dos braços, consequência daquela sessão na cozinha. Ao olhar melhor para a cara da morena, Susana deparou-se com algumas feridas, sobretudo no pescoço, “Ai desculpa…”
“Não tem importância”, sossegou-a Daniela, completamente ignorante do facto de um flash ter disparado nesse preciso momento, conseguindo um óptimo plano das suas feridas. Sorrindo para a loura, disse, “Entusiasmaste-te mas eu gostei”

1 comentário:

  1. Eu disse que a Susana ia ficar toda feliz só com a ideia de ir ver as crianças!
    E tanta brutalidade -.- Aposto que a mesa era daquelas que trazem manual de instruções para montar, super fraquinha, ahah.
    E, como sabes, gostei da ideia da Daniela começar a ceder em relação a ter filhos.
    E já sabes que este fim não me escapou!
    Gostei muito do capítulo, acho que foi dos que mais gostei até agora. Conseguiste dar avanços importantes na história e ao mesmo tempo conseguiste escrever algo descritivo o suficiente para te manteres no teu registo.
    Sou muito sincera contigo, merecias muito mais reconhecimento daquilo que tens criado aqui.
    Gosto imenso! 77 já lá vão, e venha o próximo!
    Uma viajante dos blogues :) *

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