quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Capítulo 76

Que melhor maneira de iniciar o novo ano do que deparando-se, logo pela manhã, com uma nova revista colocada no local de destaque, por entre os jornais desportivos, nas bancas? Na opinião de Daniela, seria complicado encontrar melhor forma de estampar um sorriso no rosto do que deparando-se com o título gritante, “Confirma-se: CASADA”, por cima de uma foto de ambas que aparentava ter sido tirada no caminho desde o carro até ao restaurante. Nos últimos tempos a especulação havia sido tão grande que seria apenas uma questão de tempo até que obtivessem a confirmação.
Ainda assim, a rapariga não conseguiu conter a sua curiosidade no que dizia respeito ao conteúdo daquele artigo. Pondo um par de moedas em cima do balcão, comprou um exemplar, que folheou até às páginas em questão. O certo era que já se tinha vindo a mentalizar que mais dia, menos dia, iria ser do conhecimento público, tanto mais que se sentia quase indiferente, divertida até, com o chorrilho que iria encontrar. Não estava assim tão mau até, as fotos tinham ficado muito bem, gostou especialmente do seu cabelo naquela em que estava ao colo de Susana, tinham conseguido apanhar os seus reflexos vermelhos. Noutra, não pôde deixar de notar que a loura tinha ficado com o peito bastante enfatizado, tanto que murmurou, “Quem pode, pode e a Dani pode”
Rindo, leu todo aquele artigo, que no fundo não era nada que já não esperasse, pelo menos até chegar a uma certa parte, “Uma fonte, conhecida da mulher de Susana, partilhou connosco alguns pormenores: Realmente não sei como é que a Marques alguma vez olhou para ela, nem se digna a chegar a horas ao trabalho, é antipática e pouco profissional, de conduta duvidosa. Se não visse a Marques visitá-la ao escritório, não acreditava”. Ao menos Ana podia ter-se dado ao trabalho de não tornar tão óbvia a sua identidade, talvez nem se importasse com esconder-se. Revirando os olhos, a morena sussurrou, “Pouco profissional…faço mais que ela em metade do tempo e ainda não parti nenhuma cadeira”
O mais provável era que Susana já tivesse visto, mas Daniela não deitou fora a revista, pelo sim, pelo não, teria papel higiénico. Assim que chegasse ao escritório, Ana teria os seus dias contados. Até teria simplesmente ignorado, caso a outra não tivesse posto em causa o seu profissionalismo, correndo o risco de a prejudicar. Mas também não queria levantar ondas no seu local de trabalho. Teve uma ideia, podia parecer infantil, digna de uma criança de doze anos, mas havia que ser subtil e rápida e, ainda havia de se rir. Passou por uma farmácia local e adquiriu duas caixas do que seria o seu parceiro no crime, uma para diversão sua, outra porque era um pormenor necessário para difamar Ana. Olho por olho.
“Olhe que isso é muito forte, tome pouco!”, advertiu a farmacêutica, alarmada.
“Não se preocupe”, assegurou a rapariga, sorridente.
O Plano “Arrebenta ca Popota” estava em marcha. Para tornar tudo mais credível, amachucou um pouco a caixa e tirou alguns comprimidos para lhe dar um aspecto usado. Depois, retirou o outro medicamento da embalagem, colocando os comprimidos no bolso, prontos a serem usados. Livrou-se das provas incriminatórias a uma distância segura do local de trabalho, afinal o seguro morreu de velho. Colocando uma cara indiferente, para as aparências, entrou no escritório, passando pelo espaço de Ana, deparando-se, para seu horror, com esta debruçada sobre a mesa, procurando algo que caíra ao chão e proporcionando uma vista demasiado generosa do “Hambúrguer”, como Susana lhe chamava.
Esperando que não saísse de lá morcegos, a morena olhou em busca do que procurava, a caneca de chá, chá esse que mais aparentava ser petróleo, que a colega tinha sempre em cima da mesa, na esperança que aquilo a emagrecesse. Ali estava, fumegante. Levando a mão ao bolso, Daniela despejou todos os comprimidos lá para dentro, sorrindo, “Vais ver como emagreces”
Indo para o seu espaço, ligou o computador, constatando que o seu trabalho estava, muito até, adiantado, “Pouco profissional o cu dela…”. Assim que estava tudo operacional, acedeu ao facebook de Ana, guardando algumas fotos sugestivas, uma vez que a colega adorava posar com os glúteos em destaque. Assim que tinha o material ao seu dispor, acedeu a um “site de encontros”, todo ele tresandava a homens de quarenta anos com fetiche por hentai e que ainda viviam na cave da mãe com uma boneca insuflável debaixo da cama. Criou uma conta para Ana, pondo na informação, “Gosta por trás forte e feio”
Eliminando o histórico e as fotos, uniu as pontas dos dedos, na sua melhor personificação do Mr.Burns, “Eeeexcelent”
“Agora esperamos”, disse, para si, fazendo já a contagem decrescente. A farmacêutica tinha-a avisado de que apenas um comprimido seria suficiente para uma pessoa de tamanho médio, mas a colega fazia pelo menos duas e a rapariga servira-se da caixa inteira, mesmo que o seu desagrado pela outra não chegasse a ponto de a querer numa maca a caminho do hospital. Uns minutos mais tarde, aparece Ana a correr pelos corredores, a caminho da casa de banho, mais cor-de-rosa que nunca, suada, mal se contendo a tempo de pôr o seu traseiro colossal na pobre sanita. O som emanado pela colega era algo semelhante a uma égua com o cio sob o efeito de hormonas. Bem que a farmacêutica tinha dito que os laxantes eram fortes.
Servindo-se da confusão gerada por Ana, Daniela passou pelo espaço desta, deixando a caixa que dizia “Para o tratamento de fungos vaginais”, num local visível mas não óbvio demais. Para dar a facada incendiária na colega, abriu a página que tinha criado para esta, no computador dela. Sentando-se na sua cadeira, recomeçou a trabalhar, mesmo a tempo de ver Ana, que parecia envelhecida, regressar, ofegante, com uma mancha de suor debaixo das axilas, “Ai…parece que pari um filho”
Contendo o riso, a morena, voltou a sua atenção para o trabalho, orgulhosa de si mesma. A sua atenção foi dispersada no momento em que o telemóvel dera sinal de si, avisando-a de que iria ter boleia de Susana para casa. Dirigindo toda a sua concentração para o computador, foi novamente interrompida, agora por um colega que tivera a ideia de utilizar a casa de banho, “Aaaaaii!”, ao mesmo tempo que a água acastanhada corria pelo corredor abaixo com dejectos flutuantes, como o caudal de um rio.
Enquanto a empregada acudia à crise, de esfregona em punho e coragem bem no coração, Ana já dera pelo comprimido de combate ao fungo vaginal e pelo site duvidoso, “Sousa!!”
Chapinhando por entre os obstáculos de desperdício orgânico, a colega, demasiado enraivecida para deixar que algo tão insignificante como o embaraço se intrometesse. Abriu a porta de par em par, agarrou Daniela pelo colarinho da camisa e gritou, “Oh minha puta!”
Avistando o seu “superior” principal, a morena, desejosa de preservar a sua imagem de profissional séria e competente, soube imediatamente que postura adoptar. Arrancando a mão gordurosa e, decididamente, infectada de germes, a rapariga, no seu ar mais sério, replicou, “A doutora importa-se?”
“Não me tomes por parva, eu sei muito bem que andaste envolvida nisto!”, guinchou Ana, escarlate de raiva. Já ia para desfazer Daniela, quando o advogado mais velho as separa, repreendendo a outra, “Mas a doutora pensa que isto é uma casa de ciganos?! O que é que se passa aqui?”
“Também gostava de saber, eu estava a tratar do que me tinha pedido quando a minha colega entra por aqui assim”, respondeu a rapariga, vitimizando-se, apontando para as marcas vermelhas que a colega lhe deixara no pescoço.
“Vais levar nessa cara!”, gritou Ana, empurrando o advogado, que se enfureceu, também.
Voltando a separar Ana da morena, o “superior”, acabou por declarar, “Assim não dá para trabalhar!”
Assim se viu Daniela, juntamente com toda a população do escritório em peso, despachados umas boas horas mais cedo. Ligou para Susana, dizendo-lhe para vir assim que estivesse disponível e esta, tendo tido o dia de folga, em pouco tempo estava ali. Nem era para tirar o capacete, não fosse a rapariga tê-la abraçado, quase a fazendo desequilibrar-se da mota. Toda aquela demonstração de afectos surpreendeu a loura, ciente do artigo nefasto publicado naquele dia. No mínimo esperava que a morena lhe pedisse para não aparecer nos próximos meses por ali, não que se desfizesse em abraços, sorridente.
“Estou a ver que o dia correu bem”, brincou a outra, assim que tirou o capacete.
Aproveitando o facto de Ana estar nas imediações e a olhar naquela direcção, Daniela beijou Susana, passando o braço por trás desta, fazendo um gesto obsceno com o dedo para a colega.
“Correu às mil maravilhas”

1 comentário:

  1. Tipo... Não consigo ter um comentário a fazer neste capítulo. Simplesmente ri-me muito a imaginar toda esta cena, ahah.
    Tu estás mesmo de parabéns :)
    Uma viajante dos blogues :) *

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