terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

Capítulo 6


Se no dia anterior Daniela tinha dado graças aos céus por a terem abençoado com uma boa família, agora estava a maldizer as inúmeras regras ridículas do século passado dos pais. Pronto que a culpa de não ter especificado para onde nem com quem ia estar era sua, mas não era caso para exagerar, afinal já era adulta e tinha sentido de responsabilidade suficiente para não ter pegado no carro e espetado com ele por uma falésia abaixo. Enfim, à conta disso não estava possibilitada de sair e de guiar durante tempos indefinidos. Depois de prevenir Pedro de que estava em prisão domiciliária, viu que tinha uma mensagem de Susana:
“Houve muitos problemas com os teus pais?”
A morena não se sentiu com vontade de responder, optando por carregar na tecla verde (sim porque nunca tinha sido grande fã dos “touch”) e falar por chamada. A loura não demorou muito a atender e a perguntar-lhe se estava bem, num tom de voz preocupado e tenso que não condizia nada com a sua disposição habitual e que tinha apenas usado quando viu o estado da rapariga no dia anterior.
“Estou impossibilitada de sair nem que seja para ir à caixa do correio”, respondeu Daniela num tom negro, “Não posso pegar no carro, mesmo que raramente mo deixassem fazer, de qualquer forma”
“Isso tudo foi porquê?”, questionou Susana. A situação parecia-lhe demasiado exagerada.
“Porque saí sem dizer com quem nem para onde ia”, zombou a rapariga, “Sou legalmente adulta mas não posso dar um passo sem avisar”
“Que cena…vais ficar de castigo quanto tempo?”, continuou a outra, “É que para a semana vai haver uma festa lá no bar e gostava que viesses comigo”
“Oh, estou de castigo durante tempo indefinido mas para a semana quase de certeza que já estou livre”, disse a morena, “Olha, lembrei-me agora, o que é que me ias dizer quando fomos interrompidas?”
“Se te disser agora nestas condições não tem jeito nenhum”, respondeu a loura. Do seu lado da linha ouviu-se uma voz rouca e frágil a chamá-la, “Desculpa a minha avó está-me a chamar, já digo qualquer coisa, beijinho”
Nos dias que se seguiram Daniela tentou dar a sua melhor imagem de boa menina arrependida e tratou das lidas domésticas praticamente todas, apesar de terem empregada. Viu que as notas tinham sido boas e tudo mais, só esperava que o castigo aligeirasse. Ainda assim, via a data da festa a aproximar-se e continuava em prisão domiciliária, para sua frustração. Servia-lhe de consolo Susana estar sempre disponível para atender o telemóvel durante uma hora ou duas. De certa forma este aspecto contribuiu para que falassem mais e se conhecessem melhor, pois ao vivo as coisas tinham sempre uma certa tendência para aquecer.
Era a véspera da festa e o castigo permanecia. A morena estava a ficar sem alternativas, já tinha tentado de tudo, desde um pedido de desculpas com o seu irresistível “olhar de Bambi”, a tornar-se a segunda empregada/serva pessoal dos pais. Pedro propusera-lhe uma hipótese que só seria minimamente considerada em casos de aflição. O próprio rapaz nem sabe como é que se propôs a ajudar assim a amiga, afinal apesar de todas as coisas positivas que a rapariga lhe contara sobre a outra, continuava a não gostar dela. A tal ideia era escapulir-se de casa à socapa e aparecer no bar como surpresa para a loura, visto que esta estava a contar que a morena não fosse e tinha ficado bastante aborrecida quando a rapariga lho disse.
Como Pedro não a podia acompanhar, a morena decidiu propor a uma amiga que a acompanhasse. Felizmente, Marta estava mais do que disposta a ir com ela à tal festa, que seria, também, a sua primeira saída a um bar…gay. Tendo em conta que Marta era bissexual, poderia achar a noite bem mais interessante e menos incomodativa que qualquer outra pessoa.
Foi assim que, duas horas antes de começar a festa, Daniela disse aos pais que se ia deitar cedo. Decidiu utilizar o velho truque das almofadas por baixo dos lençóis e sair pela janela, o que não foi difícil tendo em conta que apoiou os pés na casota do cão que ficava por baixo. Não era um plano elegante nem infalível, mas se tudo corresse bem não seria apanhada. Foi só questão de estudar muito bem os horários dos autocarros e comboios e de se encontrar com a amiga e estavam lá apenas com meia hora de atraso. Show time.

1 comentário:

  1. está lindo, tens imenso jeito para isto :o
    devias publicar um livro !

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